terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Feliz história velha

A história é a imagem refletida no futuro. A virtude que os funde é o vício que os tornam sempre os mesmos.

Já não comemoro a partida do ano com tanto entusiasmo quanto antes. Os anos que passam golpearam com tanta exatidão o meu corpo que, surrado, já não esbanja seus vinte e poucos anos a muitos outros anos.
Mas o tempo não foi capaz de corromper a minha intocável capacidade de memória.
Faz pouco mais de quinze anos. O deputado Dutra estava celebrando a chegada do ano novo em sua cobertura no então Golden Palace, localizado na orla de uma das praias mais movimentadas das terras tupiniquins.
Quando o relógio marcou vinte e três horas e cinquenta e cinco minutos, Dutra chamou a atenção a si batendo com uma colher em sua taça de champanhe.
Em seu discurso, não racionou pedidos de paz, prosperidades e alegrias para o ano que raiava.
Ainda em seu discurso, Dutra pediu que fosse servido, aos convidados, papel e caneta para que pudessem retratar seus desejos como imagens a serem materializadas no futuro ano seguinte. Ao final, todos os pedidos deveriam ser depositados em uma urna que, em seguida, seria lançada ao mar como uma típica oferenda pagã. Tal fato me causou estranheza uma vez que a onipresença de cristo era validada nos discursos soltos naquele apartamento. Talvez os pedidos depositados fossem de tal profano que ao Deus cristão só caberia o perdão, logo, recorrer a outros Deuses renovava a esperança de alcançar o fetiche.
Não me julgo curiosa, apenas tenho o espírito investigativo em constante ereção.
Antes que todos depositassem seus pedidos e a urna lacrada, tratei de surrupiar, discretamente, dois ou três dos papeis.
Leitura interessante. Pude obter um prova material do que já conhecia em sua imaterialidade.
A opressão concebida pela consciência humana para com a própria consciência humana. Aquela latência que nos convence, ou nos acomoda, da condição de não provedores da nossa história.
O novo pode renovar velhas expectativas, mas não cria uma nova realidade. Cabe a cada homem e mulher construir sua própria nação.
Cabe a humanidade a capacidade de governar o exército de sentimento frente à fronte da vida. Capaz de demandar ao corpo o sentido.
A história deste ano será escrita por suas ações e não pela simples passagem de tempo.
Os acontecimentos em sua vida não são profecias em urnas ao mar. A sua história é a descrição de sua vida.
Feliz ano novo.

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